sexta-feira, 7 de abril de 2017

Anotações enquanto meu pai está internado no hospital

O dia não raia

( Texto escrito em 13/11/2008 , por volta de 00h08min, na enfermaria do pronto-socorro do Hospital Walfredo Gurgel, enquanto acompanhava meu pai - que estava internado)

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       Eis que o dia năo raia. 


       Nesta insólita 01:30h da madrugada, em que a lâmpada é apagada, sondo as sombras das quais têm sido feitos esses dias últimos. A luz sequer está no fim do canal. Pode ser que esteja difusa. Eu năo a pressinto, mas muito a desejo. 



       Dez dias de escuridăo. O entorno năo oferece consolo. Um corredor de sofrimento à direita, outro à esquerda. Meu pai é lançado nesse vai e vem como uma marionete, cujo substrato é um monte de retalhos e espumas.



       Caminho pelos corredores como uma errante a procurar os próprios caminhos, a luz que esconde-se em cada esquina ou por trás de tantas cancelas.



       Procuro por năo sei mais o quę. Quem sabe năo encontre uma faísca acesa da paciência que perdi nesse bosque de sobeja perdiçăo?


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       Tantas pessoas. Pouco sentimento. O zelo do maior cuidado só existe entre os acompanhantes que tutoram atenciosamente seus entes queridos. Entre a maioria dos profissionais (poderiam ser assim chamados?) da saúde isso é um raro achado.

       As pessoas que por obrigaçăo devem exercer o ofício vestidas de branco, e por isso assemelham-se a anjos, contraditoriamente săo indiferentes a urros de dor, ao desespero, a lágrimas fabricadas pela incontinente desesperança.



       Nesse lugar onde tudo falta – copos, seringas, coletores de urina-, falta também o substancial. Falta profissionalismo. Falta respeito. Falta, sobretudo, amor.



       Se a dignidade năo for senhora absoluta de algum caráter, ela certamente é a primeira que esvai-se. E se ela vai embora, é o fim da criatura. Fica somente a sombra. Um magma de merda, como já foi escrito aqui antes.


       

       Almejo que o dia raie. Que a aurora floresça linda, fazendo-me ver cheiros multicoloridos, tocar visőes que acalantam, cheirar cançőes que enlevam o espírito...Enfim, ver as coisas ficarem como sempre foram. Se bem que a lágrima que agora rompe esta folha mostra que nada é imutável. Sofri um tombo no caminho escuro. A ida de minha avó interrompeu uma existência alegre, enérgica, jovial. Ela é a minha princesa elétrica. Nada fácil...


       Quem caiu de pára-quedas nessa selva deve ser mais forte do que a dor. Desdobrar-se e tripudiar dela, amassá-la e depois jogá-la com desprezo no bolso, senăo, sucumbe com o enfermo.



       Decerto que lá fora botőes de rosa florescem, trabalhadores da madrugada exercem seus labores, animados procuram agitaçăo, animais e homens entram na moita para acasalar e tudo o mais segue a sua normalidade até o amanhecer. Daqui a pouco é dia, mas aqui ele năo parece raiar. O sol năo foi pródigo em iluminar o Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, essa selva perigosa e muito, muito, mas muito inabitável.



       De quem acompanha o pai convalescer na selva inóspita que é o HMWG.


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Obs.: Foram quase dois meses de internação. Meu pai recebeu alta no dia do seu aniversário: 19-12-2008. Glória a Deus!!!


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