terça-feira, 13 de setembro de 2016

Sobre ser superior e suprimir a própria humanidade

 

   Não é de hoje que espera-se da mulher o recato, a delicadeza e uma fragilidade para muitos charmosa e envolvente. Somos educadas a não chamar palavrão, a falar pouco, a estudar e só namorar mais tarde, a usar roupas comportadas, a falar pouco, a rir baixo, a ser discreta, ser delicada e mansa, a ser bela, ser magra e comer pouco. Se possível, ser do lar também, porque ninguém é de ferro. O que fazemos com a realidade de que somos humanas, demasiadamente humanas? Deparamo-nos então com realidades próprias e de amigas, dando conta que até homens aparentemente diferenciados, mais progressistas e inteligentes, admiradores de mulheres avançadas e independentes, não sustentam a atração e sucumbem à convivência com mulheres que colocam-se no oposto da servidão ou da mansidão. Ao ler o Think Olga por estes dias, deparei-me com esse texto da Luíse Bello. É muito bom ver outras pessoas esforçando-se para tentar refletir sobre nossa natureza humana, intrinsecamente complexa. Desde a gênese somos assim: sem pólos, binarismos ou extremos. Como tal, podemos sucumbir e sofrer, errar e acertar, exagerar e faltar, e isso é a vida. Não podemos nos descaracterizar em nome de uma máscara social, sustentada por dores às vezes demasiado profundas. Nada vale suprimir nossa humanidade. Então o lance é o seguinte: vamos gritar, desabafar, chorar e deprimir o tempo que for necessário.  Faz bem.

 

Leiamos:

 

Não seja superior: seja você mesma


   A atriz Amber Heard está sendo elogiada e celebrada por doar à caridade os US$ 7 milhões que receberá no seu acordo de divórcio com o ator Johnny Depp. É como se essa atitude fosse um “tapa com luva de pelica” na cara de todo mundo que a chamou de oportunista quando ela o acusou de violência doméstica e pediu a separação. Nessa história, Amber está “saindo por cima”. Mas será que está mesmo?

   A famosa página Humans of New York, que traz retratos de pessoas comuns contando um pouco de suas histórias na cidade, recentemente publicou o caso de uma senhora que, após traída em um longo casamento com filhos e ver seu ex-marido casar-se com a amante, passou por cima de sua própria mágoa para manter um bom relacionamento com o pai das crianças, chegando até a participar de festas em seu novo lar. Nos comentários, milhares elogiando sua capacidade de ser uma “super mãe” que faz “tudo pelas crianças”. Mas o que é “tudo”?

   A escritora renomada J.K. Rowling defendeu o nadador Tom Daley após ele ter sido vítima de trolls homofóbicos no Twitter. Como é de praxe, conselhos do tipo “não alimente os trolls”, “é isso o que eles querem”, “não adianta discutir” começaram a pipocar, porque é isso o que esperam de quem sofre esse tipo de ataque: que se calem, que sejam superiores, que não percam o seu tempo com quem não vale a pena. Mas, no final, quem está pagando essa pena?

   Qual é a definição de ser superior quando uma mulher vive uma experiência negativa, senão ignorá-la e fazer boas ações mesmo com seu coração cheio de mágoas? Porque devemos almejar sempre sermos vistas como santas, como pessoas tão superiores que jamais se afligem com as provações terrenas, quando isso, na prática, significa um sofrimento calado, uma raiva engolida? Isso tudo nos faz mal, nos adoece, mas quantas vezes achamos isso melhor do que “descer o nível” e sermos vistas como, imaginem vocês, humanas?

   Para as mulheres negras essa situação se agrava por causa do estereótipo de “barraqueiras”, como se agressividade fosse algo esperado delas. Afinal, a ideia de uma mulher agressivamente lutando por algum direito seu, nem que seja por respeito ou dignidade, não é muito feminina. Esse tipo de atitude aborrece uma sociedade que nos quer ver sempre mudas e coniventes com nosso próprio sofrimento. Quando algo nos prejudica, SEMPRE há consequências emocionais: o que é esperado de nós, porém, é que internalizemos a dor para não causar distúrbios no privilégio masculino. Ser superior é fazer com a raiva sentida por uma mulher silenciosamente imploda dentro dela e não exploda em praça pública.

   Mas estamos em guerra contra o machismo e vai haver explosões no caminho. Nossa raiva tem uma razão de ser. E, se aprendemos que a atitude certa ao sermos atacadas é ignorar, deixar pra lá, somos também impedidas de exercer nossa liberdade de expressão. “Obrigar a pessoa ofendida a ser superior é pedir que engulam uma traição, ofereçam perdão automaticamente e, dessa forma, tomar para si ainda mais dor. É por isso que ser superior é um saco. E, muito frequentemente, sexista”, escreveu Elaine Lui em um artigo brilhante sobre o assunto (em inglês, leia aqui: http://www.flare.com/culture/lainey-flare-eff-forgiveness).

   Afinal, quando ofendidos, os homens são até celebrados ao reagir. Um exemplo recente é o jogador Neymar que, após a vitória do futebol masculino na final Olímpica, podia dar qualquer declaração positiva sobre o significado desse momento, mas decidiu levar para o pessoal e dizer: “Vocês vão ter que me engolir”, em infeliz referência ao ex-técnico Zagallo que proferiu a mesma frase após também ter sido momentaneamente desacreditado. Na internet, a reação foi de muita compreensão ao Neymar e sabemos que o comportamento explosivo de Zagallo sempre foi visto como parte de sua personalidade sem que isso interferisse na sua capacidade profissional.

   Aliás, homens do entretenimento constroem carreiras inteiras em cima da fama de zangados, vide apresentadores de programas policialescos, que se exaltam e até mesmo gritam diante das câmeras, e figuras controversas como o rapper Chris Brown que, mesmo após um episódio seríssimo e comprovado de violência doméstica, continua com sua carreira praticamente intacta. A raiva masculina é perdoada e a das mulheres deve se converter em perdão. Ainda que de maneira pacífica, uma mulher que resolve falar sobre suas mágoas é vista como fraca, sentimentalóide, alguém que não superou algo que já devia ter sido esquecido. É só lembrar que Taylor Swift, mesmo sendo branca e muito privilegiada, tem uma fama negativa por escrever músicas sobre relacionamentos passados – como se diversos cantores já não tivessem feito exatamente a mesma coisa (Olá, Adam Levine e o álbum Songs About Jane).

   Vamos combinar uma coisa? Na próxima vez em que formos magoadas, feridas, traídas e prejudicadas, vamos “ser superiores” somente se for a nossa vontade, se isso não nos matar por dentro, se nos trouxer paz e segurança. Caso contrário, vamos respeitar nossos sentimentos e exigir que os outros façam o mesmo. Diferente do que muita gente nos fez acreditar a vida inteira, isso não é pedir demais. É apenas o que é justo.#RaivaComRazão


Ler texto original no link: http://thinkolga.com/2016/08/26/nao-seja-superior-seja-voce-mesma/

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